quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

OS VESTÍGIOS DO DIA


Há muito tempo atrás assisti ao filme inspirado/baseado na obra de Ishiguro, que confesso me encantou totalmente. Mas, só recentemente soube da existência do livro e embora tivesse ficado curiosa não me mexi para adquiri-lo ou lê-lo. Lembro de ter verificado se havia exemplar disponível nas bibliotecas, mas fiquei por aí. Até que um dia, inspirada por mais uma das indicações da Claire, comprei o livro na Estante Virtual.  O livro chegou e ai vocês já sabem, não é? Direto para a pilha. E agora que resolvo ler o livro descubro que ainda tem um cheiro de mofo e guardado insuportáveis (e toda aquela trabalheira/limpeza inicial não valeram de nada?). As primeiras tentativas de leitura foram absolutamente infrutíferas, mas empenho e persistência na higienização quase que eliminaram o problema.  

Mas, vamos à leitura. Começo dizendo que a narrativa de Ishiguro é por demais elegante, o que me encanta. Os vestígios do dia alterna trechos do mordomo Stevens em uma viagem pelo interior da Inglaterra com as suas  memórias e reflexões. 
A narrativa elegante de Ishiguro me faz lembrar dos livros do Wodehouse, e também do Machado em Memorial de Aires. Não é preciso dizer que são escritos que gosto muito. Assim como em o Memorial a leitura deste é pausada e sobretudo contemplativa.

Stevens é contido e totalmente focado em ser o melhor naquilo que faz, seria o sonho de consumo de qualquer empregador da contemporaneidade e de tempos idos. O que me leva a refletir sobre o que nos chama a atenção quando lemos o livro, se para uns o livro soa por demais melancólico e o lado intimista é o que impera, incomodando outros tantos que preferem mais ação e menos reflexão, o meu olhar bateu direto no Stevens profissional e passou grande parte do tempo analisando o seu perfil, e fazendo analogias ao mundo do trabalho.  E devo dizer que o mundo corporativo ainda tem alguns/uns/vários(?) Stevens trabalhando por lá. ;)

O lado intimista e bucólico que norteia toda a narrativa me agrada muito. Apesar do brilhantismo esse livro não seria indicado para todo tipo de leitor, aqueles que procuram ação vão achá-lo entediante, os que desejam grandes piadas e  risos, provavelmente não vão gostar da ironia refinada e completamente sútil encontrada aqui e ali,  e aqueles gostam da contemporaneidade vão achá-lo absurdamente "démodé" e ainda assim tanta gente (como eu) adora ele. 

Grifos
Se o que o senhor diz é verdade,  acho que prefiro ficar aqui - retruquei.- Acontece que estou iniciando uma viagem de carro, durante a qual espero contemplar muitas paisagens esplêndidas. Ver o melhor antes de ter realmente iniciado seria um tanto prematuro. 
Nós, ingleses, com frequência temos um modo de ver as coisas diferente daquele dos franceses,  Sr Lewis. 87
É errado continuar odiando assim um inimigo depois de terminado o conflito. Quando se consegue derrubar o adversário, isso devia ser o final da luta. Não se pode continuar a dar-lhe pontapés. 87
Apesar de todas as lembranças tristes,  sempre que hoje em dia relembro aquela constato que o faço com uma enorme sensação de triunfo.  110
Mas qual o sentido estar sempre especulando o que poderia ter acontecido se uma dada ocasião tivesse um desfecho diferente. É provável que assim uma pessoa acabe perdendo o juízo. 172
Embora obviamente, essa tenha sido uma situação ligeiramente constrangedora, estava longe de ser a mais difícil, ou até mesmo singular, que uma pessoa pode encontrar no decurso das suas obrigações, e todos sem dúvida concordarão que qualquer profissional decente deve estar preparado para aceitar tranquilamente tais ocorrências.  Portanto, eu já quase esquecera o episódio na manha seguinte. 189
Conheci pessoalmente pelo menos dois profissionais , ambos de certa capacidade, que passavam de um patrão para outro, eternamente insatisfeitos, nunca se fixando em parte alguma, até desaparecerem de vista. 192


Título:  Os vestígios do  dia 
Autor:  Kazuo Ishiguro
Editora:  Record/Altaya
Pág: 233
Leitura: 24.01 a  15/02/2016
Tema: Autores asiáticos
Sinopse: Para Stevens, mordomo que durante anos trabalhou para um aristocrata no interior da Inglaterra, dignidade é exercer com perfeição a tarefa de bem servir a seu patrão. Mesmo que para isso tenha que abdicar de seus sentimentos e emoções que também, e principalmente, dignificam a existência. Após a morte do ambíguo Lord Darlington, contudo, por um breve momento avalia se tudo valeu a pena.
"Os vestígios do dia", vencedor do Booker Prize de 1989, o maior prêmio literário da Inglaterra, traça o perfil do patético Stevens com a sutileza e a profundidade que fizeram de Kazuo Ishiguro um dos maiores autores mais conceituados da Europa.




2 comentários:

  1. Acho que me encaixo no grupo dos que gostam da contemporaneidade, mas ainda assim tenho curiosidade em ler esse livro.

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    1. Oi, Ligia.
      Ainda não conheço muito de seus gostos literários, mas creio que poderá sim gostar de Os vestígios do dia.
      É sempre bom vê-la por aqui, obrigada! ;)

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